Em um encontro que misturou afeto, tradição e resistência, a I Festa Literária de Malhada de Pedras promoveu uma mesa de conversa com o tema “A contação de histórias e a formação humana”, reunindo as escritoras Núbia Paiva (@nubiappaiva) e Bruna Leticia (@ibrunaleticia), que são educadoras e contadoras de histórias, para debater o poder das narrativas na infância e o papel da mulher na preservação cultural. O evento, destacou a literatura infantil, as raízes africanas e indígenas na oralidade, e a força da escrita feminina regional.
A discussão começou com uma reflexão sobre a literatura infantil como ferramenta de formação humana. As educadoras destacaram que, mais do que entreter, as histórias moldam valores, estimulam a empatia e ajudam as crianças a compreenderem o mundo.

Segundo Bruna Leticia, professora e historiadora, “é preciso se atentar ao que é poético na vida da criança, a gente costuma pensa no que a gente gostaria que a criança gostasse de ler, aprender e observar, mas podemos encontrar o caminho para nós escritores de literatura infantil propondo uma troca com os olhares dessas crianças.”
Um dos pontos altos foi a discussão sobre a arte de contar histórias nas culturas africanas e indígenas, onde a oralidade é sagrada e funciona como transmissão de saberes ancestrais. “Nas tradições africanas e indígenas, a contação de histórias faz parte dos ensinamentos de um povo – são ritos de passagem e lições a comunidade”, explicou Núbia Paiva, especialista em performances narrativas.
Outro tema abordado foi a performance na contação de histórias infantis. As convidadas demonstraram, na prática, como a entonação, os gestos e a expressão corporal fazem a diferença. “As crianças acreditam nas histórias não só pelo enredo, mas pela forma como são narradas.” disse Núbia Paiva, que encantou o público com pequenos trechos de seu livro.
A segunda rodada da mesa trouxe um olhar sobre a literatura feminina regional e seu papel na preservação da memória afetiva e cultural. Foi destacado que, em muitas famílias, as histórias são predominantemente transmitidas por figuras femininas – avós, mães, tias –, criando uma cadeia de afeto e resistência.
A mesa reforçou que, em um país com fortes desigualdades regionais e de gênero, a escrita feminina se torna um espaço de resistência, registrando histórias que antes ficavam restritas à oralidade ou eram invisibilizadas.
Para Núbia Paiva, “Não tem nem como você falar da sua literatura sem falar da literatura regional, porque a sua literatura é regional. Eu acho que é toda escrita de alguma forma autobiográfica. Ela é regional, porque ela é composta de um território. Ela é composta de uma terra, de um jeito de falar, de um jeito de viver, de um jeito de comer, de um jeito de se relacionar. Aí não tem como a sua literatura não ser regionalista. Ela pode alcançar o mundo, mas ela é regional. Ela pode alcançar o mundo, mas se você tem um jeito próprio de falar, ela é regional. E aí, de certa forma, a gente acaba criando a nossa própria língua, né? Você carrega a sua região. Tem um autor que diz assim, ‘toda escrita deveria ser uma carta de amor’, Nietzsche fala isso. Deveria ser uma carta de amor porque é o amor que a gente tem pelas coisas, pelo seu território, pelas coisas que você vive, que você quer espalhar para outras pessoas, outros territórios e outras formas de viver o mundo.”
As educadoras deixaram claro que, seja na roda de conversa de uma cozinha, nos livros ou nos palcos de feiras literárias, narrar é um ato de transformação – e as mulheres, especialmente as do interior, são guardiãs desse legado.