O Esporte Clube Vitória e o governo da Bahia têm travado uma longa batalha em torno de uma dívida histórica do clube, fruto de um convênio firmado com a Secretaria de Desenvolvimento Urbano da Bahia (Sedur-BA) em 2009. O Leão ainda não repassou à gestão estadual um terreno de 2 mil m² localizado dentro da Toca do Leão, em Salvador.
A área, que fica às margens da Avenida Mário Sérgio, no bairro de Canabrava, era uma das contrapartidas do Convênio nº 07/2009, que previa uma série de investimentos no CT do Rubro-negro baiano na ordem de R$ 11,5 milhões (confira mais detalhes abaixo).
O problema é que, de um lado, o Vitória afirma que “jamais houve negativa do clube em viabilizar a doação da área”, chegando a alegar “omissão” da Sedur durante as tratativas. Por sua vez, a pasta afirma que, na verdade, o próprio Vitória que não repassou as documentações necessárias para viabilizar a transferência do terreno.
A edição deste domingo (5) da BNews Premium vai destrinchar uma extensa queda de braço protagonizada pelo Leão da Barra e pela Sedur, que se arrasta junto ao Tribunal de Contas do Estado (TCE) desde 2016 — e segue sem data para ter um fim.
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“Devo não nego, pago quando puder”
A BNews Premium analisou os autos do processo que corre no TCE. Em uma de suas manifestações, o Rubro-negro baiano afirma que houve “omissão” por parte da gestão estadual no andamento das tratativas para análise do local e levantamentos técnicos que viabilizem a efetivação da doação.
O clube ainda alega que enviou, ainda no dia 29 de abril de 2024, um ofício para a Sedur com uma “perfeita identificação da nova área disponibilizada, acompanhada de planta de localização, topográfica, de poligonal, além de fotos em que se visualiza o imóvel”.
Contudo, até o momento, continua sem haver, por parte da Sedur, posição definitiva em relação a tais levantamentos, de modo a proporcionar a transferência definitiva do bem imóvel e consequente finalização do convênio, com o cumprimento da correspondente obrigação por parte do Esporte Clube Vitória”, dizia o clube em documentação datada de 10 janeiro de 2025.
Diante das reiteradas reclamações do Vitória ao TCE, a Corte de Contas notificou a Sedur sobre as alegações em ao menos duas oportunidades. Uma ocorreu ainda no ano passado, no dia 27 de setembro. A outra, mais recente, foi enviada no dia 23 de maio deste ano.
Ambas foram endereçadas à secretária Jusmari Oliveira, pedindo esclarecimentos no prazo de 30 dias. Inclusive, o Vitória também destacou que a secretária já visitou o local acompanhada de técnicos da Sedur e da Companhia de Desenvolvimento Urbano da Bahia (Conder).
“Agora, a bola agora está com o Vitória”
Questionada pela BNews Premium, no entanto, a Sedur atesta que não houve inércia da sua parte. A pasta afirmou que em 22 de julho de 2025 foi enviado um ofício ao Vitória solicitando uma série de documentações para viabilizar a visita técnica ao imóvel e, posteriormente, a transferência do mesmo.
No entanto, ainda conforme a Secretaria de Desenvolvimento Urbano da Bahia, mesmo com prazo de oito dias, o ofício nunca foi respondido pelo Rubro-negro baiano. Nele, o governo da Bahia pedia:
- A Certidão Negativa de IPTU do imovel;
- a Certidão de Registro de Imóvel atualizada, contendo negativa de ônus reais ou gravames;
- além do Laudo de Avaliação Atualizado do bem imovel.
A BNews Premium obteve acesso, com exclusividade, a este documento que não consta nos autos do TCE. No ofício, consta que Vitória recebeu a notificação. Confira:

O ofício ainda afirma que apresentação da documentação é “condição necessária para viabilizar a visita técnica ao imóvel, bem como os procedimentos finais para a transferência definitiva do imóvel e a regularização das obrigações previstas no referido convênio, com vistas à conclusão do processo em trâmite no TCE”.
Questionado pela BNews Premium sobre o não envio das documentações solicitadas pelo governo da Bahia, o Vitória, através da sua assessoria de imprensa, não se manifestou até a publicação desta reportagem.
No momento, o caso segue sob análise do TCE, que encaminhou um despacho, no último dia 2 de setembro, reforçando que o Vitória “alegou omissão do governo da Bahia em encerrar as tratativas”. Diante disso, a Corte de Contas ainda frisa que a “controvérsia em torno da doação do terreno ainda não foi solucionada”.

Entenda o convênio milionário de 2009
O Convênio nº 07/2009 firmado entre o governo da Bahia e Esporte Clube Vitória — e se tornou alvo de uma investigação do Ministério Público da Bahia (MP-BA) devido a um suposto descumprimento de termos do acordo, o que teria gerado danos aos cofres públicos.

Ele previa a implantação do Programa “Vitória da Cidadania”, que consistia em uma série de investimentos no Complexo Esportivo Benedito Dourado da Luz (Toca do Leão) que iria beneficiar os moradores do bairro de Canabrava, em Salvador.
O descumprimento por parte do Leão diz respeito a um terreno de 2 mil m² colocado como contrapartida junto ao Governo da Bahia. De acordo com o acordo, o clube havia se comprometido a doar a área avaliada, à época, em R$ 220.000,00, que fica localizada às margens da Avenida Mário Sérgio, em Canabrava.
De acordo com os documentos do convênio obtidos pela BNews Premium, no momento em que foi firmada a parceria entre o clube e a Sedur, no dia 18 de setembro de 2009, os valores foram de R$ 11.008.575,00 — posteriormente atualizados para R$ 11.680.627,29, no dia 11 junho de 2014.
Na época da assinatura da parceria, o secretário da Sedur era Afonso Florence (PT) — atual secretário da Casa Civil. Já o presidente do Vitória era Alexi Portela Júnior. O convênio, finalizado em 16 de setembro de 2016 — quase sete anos depois —, chegou a ser publicado no Diário Oficial do Estado (DOE) no dia 9 de outubro de 2009.

Série de investimentos
A iniciativa previa a realização de obras como Ginásio de Esportes, Quadras Poliesportivas, urbanização, estacionamento e prestação de serviços sociais, educacionais e de iniciação desportiva para a comunidade de Canabrava e regiões circunvizinhas ao Complexo Esportivo do Estádio Manoel Barradas (Barradão).
Dos mais de R$ 11,6 milhões investidos, R$ 4,1 milhões ficaram a cargo da Sedur. À época, os recursos previstos para atender à execução do Convênio foram repassados ao Vitória por meio de cinco parcelas.
Já os R$ 7,4 milhões restantes foram arcados pelo próprio Vitória, sendo R$ 1,8 milhões utilizados para manutenção de equipamentos, segurança, contratação de profissionais para o desenvolvimento de serviços sociais, em quatro parcelas anuais, conforme especificado no Plano de Trabalho.